quinta-feira, 21 de maio de 2015

Eu, artista (!?!?)

                                                                                          (Pablo Picasso)  

Às vezes eu me sinto burra. Quase que uma toupeira. Confabulo comigo mesma pequenas discussões acerca do universo e nada. Não sai nada, Travada. Embotada. Geralmente isso acontece quando estou longe de mim, da minha alma de artista que, coitada, anda contrita, frente às exigências dessa vida atribulada. E, assim, quando estou apartada da arte, sou desligada, também, da própria vida.

A razão é que eu cresci ao som e com as imagens dos grandes, dos melhores. Minhas trilhas sonoras foram dos Chicos (o Buarque, o Science e o César); minhas canções de ninar foram entoadas por Gal, Caetano e Peninha. E até as gravuras que me fizeram ser assim, "distorcida", eram de gentes agigantadas como a Tarsila e o Picasso. São íntimos das minhas intimidades, artistas das minhas telas mentais encardidas.

Acontece que nós, artistas, não somos vistos com bons olhos. Geralmente (quando digo geralmente, quero dizer quase sempre, ou sempre no frigir dos ovos), esse substantivo de três sílabas encharcado de significado vem acompanhado pelas palavras "vagabundo" e "desocupado". Foi assim que, para driblar a vida e encaixar-me nas expectativas desse mundo bitolado, tornei-me eu, jornalista, artista das palavras, artífice dos fatos.

Mas a verdade é que, no âmago da coisa, sou mesmo das artes. Amo as cores e suas nuances; gosto de que é belo - de ser bela e de apreciar a beleza; prefiro os sons harmônicos à estridência cafona dos nossos tempos; me impressiono facilmente com a capacidade bélica de uma simples poesia. Gosto de levar cor, beleza e melodia para todos os cantos. Mas eu vivo na realidade. Nela, é preciso produzir, ter sucesso (profissional e econômico), pagar as contas e atender às enormes expectativas nossas e de todo mundo. Por isso esse conflito eterno - a batalha épica entre quem eu preciso ser e a minha alma lépida.

Assim, quando eu me sinto burra, açoitada mesmo pela dureza da vida, eu leio um livro, vomito numa página em branco, grito no silêncio de uma canção estapafúrdia a fim de apaziguar os endiabrados que insistem em libertar essa minha parte divertida. É preciso ser comedida. É preciso encontrar equilíbrio entre a mãe, a mulher, a profissional e a artista. E aprender o malabarismo dantesco para não destruir a própria existência.

Contrariando o João Bosco, eu não sou de virgem, mas tenho alma de artista, tremores nas mãos e... eita! Preciso mesmo ir ao dentista.


quarta-feira, 20 de maio de 2015

Insegurança e Terror na terra do oba-oba

Sempre fui desenrolada. Pegava ônibus a hora que fosse, ia pras festas encontrar azmiga e adorava fazer passeios antropológicos por feiras livres e mercados públicos. Nunca tive medo de cruzar, nas ruas, com os "trombadinhas" que lotam as calçadas do Recife. Para mim, eles já compunham a "paisagem natural" da cidade, deixando latente a imensa disparidade econômica entre as diversas classes sociais. Nunca tive medo - até que fui mãe.

A insegurança da Veneza Pernambucana foi um dos motivos que me fez largar tudo para ficar em casa, reclusa, imbuída apenas no ofício de ser mãe. Tinha medo de deixar a cria com uma babá e, de repente, tê-lo extirpado de mim; temia pela falta de zelo de alguém que, internamente, não amava o meu filho, apenas o dinheiro que lhe rendia. Enfim, tinha medo de tudo, inclusive da vida.

Minhas experiências, por certo, não me foram gratas. Das três babas que encontrei para Heitor, duas foram um completo desastre. A primeira chegou ao ponto de vir trabalhar bêbada e eu quase perdi as estribeiras. A segunda teve a capacidade de fingir de lhe dava alimento para parecer uma encantadora de um bebê pouco afeito a comida. A terceira, por fim, foi um bálsamo de alegria e tranquilidade. Foi graças a ela que eu consegui cortar o cordão umbilical e voltar a pensar em trabalho.

Este ano, já na faixa dos 3 de idade, colocamos Heitor, pela primeira vez, na escola. A escolhida foi uma bem pertinho da nossa casa, o que me permite levá-lo e buscá-lo a pé. Um tranquilizante, tendo em vista o transito crucificador de Recife e a falta de confiança num transporte escolar de qualidade.

Lendo o texto de Janine, acerca de segurança e pontualidade, peguei-me pensando sobre como é bom poder fazer isso - eu mesma ir levá-lo e buscá-lo -, e, por outro lado, como é frustrante sentir tanto medo. Morando no Espinheiro, bairro (tomadas as devidas proporções) privilegiado, eu deveria sentir-me mais protegida, mas não é isso que acontece. Dia desses, por exemplo, ao ir pegá-lo quando do fim da aula, cruzei com um grupo de trombadões que, ainda por cima, cheiravam cola. Apressei o passo e fiquei pensando como seria quando tivesse que passar por ali, na volta, com meu filho andando com seus passinhos curtos. Medo e revolta crescentes

Certo dia também atrasei-me. Perdi a hora e saí cerca de 10 minutos atrasada de casa. Quando, enfim, cheguei para buscá-lo, ele estava desconsolado no canto da sala, com um olhar distante e triste. Ao me ver seu rosto se iluminou. E com sua pouca idade ele lançou-me a frase que seria, para mim, como um soco no estômago - mamãe, eu pensei que você havia me esquecido. Semana passada, um amiguinho de Heitor foi esquecido pela condução. Estranhando a demora para ir buscá-lo, a escola entrou em contato com os pais e explicou o ocorrido. Imagino a aflição da mãe ao ouvir seu filhinho aos prantos, acreditando que tinha sido deixado ali, de propósito.

Aqui perto eu e meu irmão já fomos assaltados. Era noite e esquecemos as janelas do carro abertas quando, de repente, fomos abordados por dois ladrões. Ainda bem que ficamos serenos e eles quiseram apenas o celular. Mas esse pequeno episódio nos deu a devida dimensão de que, de fato, em se tratando de Brasil, não estamos seguros em lugar algum. Essa sensação de terror somente aumenta quando a gente pára e assiste aos telejornais - os locais e os nacionais. Posso jurar que, caso fosse possível, se apertássemos o TV um bocadinho, sairia dali alguns milhares de litros de sangue.

E essa sensação de insegurança e de medo constante é que me revolta. Por que não podemos, também no Brasil, ter a certeza de andarmos nas ruas sem sermos reféns do terror? Por que precisamos aceitar sermos prisioneiros de nossas próprias casas? Por que não podemos utilizar o espaço público sem medo de assaltos, sequestros, balas perdidas, violência gratuita e toda sorte de violação dos nossos direitos enquanto cidadãos e seres humanos?!

terça-feira, 19 de maio de 2015

Deliciosamente... 30! (tá bom! 33!)


Repita 33. É isso que eu tenho feito, insistentemente, para acreditar que, enfim, cheguei aos 30. Passei dos trinta. Posso jurar que há segundos atrás eu tinha vinte e poucos e era uma tonta qualquer, sonhando com uma vida de cinema. Se lá trás, na casa dos vinte, eu tivesse a cabeça que tenho hoje, teria, com toda a certeza, conquistado o mundo. Mas estou no processo.

Depois de me acostumar com o som estranho dessas seis letrinhas – T-R-I-N-T-A-, parei de enxergar as rugas, novas companheiras, e passei a ir ao encontro do que de bom há para se buscar nesta fronteira inexplorada. Ao parar para ver o que há de bom, eu tive gratas surpresas.

Descobri que, depois dos trinta, a liberdade é maior. Liberdade em todas as suas nuances – sexual, verbal, de pensamento, de crença e de um vá se foder fantástico. Liberdade de dizer não e de libertar-se do que escraviza e faz sofrer. Perdi muito tempo dos meus vinte e poucos com pessoas que açoitaram minha alma e embotaram minha evolução. Agora ando pra frente, cabeça erguida e um porrete em riste, pronto pra assolapar quem quiser me encher o saco.

A sensação de ter perdido tempo, de repente, começa a esvair-se e a dar lugar a uma energia transformadora. Aos trinta, me descobri mais forte, apesar de não menos chorona; compreendi que sempre há tempo para recomeçar, apesar de todos os tropeços; entendi que a vida é uma só e que é preciso, sim, aproveitar os pequenos prazeres; e que até o casamento fica mais interessante quando a gente se permite ter 33. Ow yes, baby!


Balzaquiana que sou (licença poética, Janine!), desenvolvi um humor sarcastico deliciosamente endiabrado. Acumulei conhecimento, o que, por certo, me tornou em uma mulher muito mais interessante. Me enxergo mais sensual, mais bonita – apesar das gordurinhas que me acompanham, intrometidas -, tenho mais ciência do meu corpo e do que é legal para mim. Sei o que quero, para onde vou e o que fazer para chegar lá (pelo menos eu acho que sei). O fato é que, a caminho dos enta, perdida não estou. Se sou loba?! Francamente: tudo é questão de ponto de vista.

domingo, 10 de maio de 2015

Sexo é imaginação....

Era para falar de sexo, esse era o desafio. Mas, entretanto, contudo e todavia, eu me peguei pensando que o sexo pelo sexo, no fim das contas, não era nada - na verdade, cheguei a conclusão que o sexo, em si, representa apenas 1% nas profundezas do relacionamento à dois. Importa, de verdade, o que vem antes, nas preliminares, quando a vontade de ser o outro agiganta-se em carinhos a fim de fazer explodir a pequena morte tão desejada.

Toda essa reflexão, acreditem, nasceu depois que eu assisti ao dicotomicamente amado e odiado 50 tons de cinza. Eu já tinha ouvido toda sorte de comentários. Tanto os femininos quanto os masculinos. Ouvi que era uma cartilha do sexo; que era uma alienação machista, que transformava as mulheres em objetos sexuais; que mulheres só se interessam por caras com dinheiro; que o filme prometia sexo e não oferecia nada, apenas o característico "moído" feminino (palavras do meu irmão). Eu, entretanto, ainda não havia formulado minhas próprias conclusões. Não li o livro e não havia assistido ao filme, então concluí que não seria certo tecer críticas sem eu mesma avaliar a história.

A cena foi engraçada. Começamos, eu e o marido, a assistir a um filme que, ao meu ver, mostrava-se muito erótico. De repente, chegaram meu irmão e a namorada e, em poucos minutos, meu pai sentou-se na sala. Assistimos, então, em família, a um dos filmes mais polêmicos da história cinematográfica (exagero meu. Licença poética, tá?!). Enquanto eu assistia ao filme e ouvia, ao fundo, os comentários revoltados do meu irmão, eu comecei a lembrar de um documentário da Discovery Channel, o qual assisti há muitos anos atrás. O doc falava justamente sobre sexo e erotismo e o que, no frigir dos ovos, chamava a atenção de machos e fêmeas, homens e mulheres, na hora da conquista. A conclusão, em todos os casos, foi exatamente a mesma.

Passarinhos, leões, tigres, elefantes, macacos, colhinhos, gatos, cachorros e, inclusive, o próprio ser humano têm uma relação muito profunda com o poder. Não falo do poder financeiro, visto que instintivamente o dinheiro não conta, mas do poder exalado pelo macho no processo de conquista da fêmea. Em todas as relações, sejam entre bichos ou seres humanos, o macho mais forte prevalece. A explicação é científica: inconscientemente a fêmea escolhe o macho que considera mais forte por uma série de decisões biológicas tomadas antes mesmo de ela nascer - o macho mais forte terá os melhores genes, aqueles que garantirão a perpetuação da espécie; o macho dominante será o mais propenso a protege-la dos perigos do dia a dia; o macho mais forte será o mais capacitado para proteger a prole e garantir a sobrevivência de todos.

Conosco, seres humanos, essa capacidade de perpetuação da espécie e de garantia dos melhores genes está intrinsecamente ligada a existência de um poder econômico ou à capacidade mostrada pelo macho de evoluir e, assim, garantir uma boa vida para a família. Já estou até ouvindo os gritos e xingamentos, mas, no fim das contas, trabalhadoras ou não, o que toda mulher procura é um cara que lhe traga segurança - e a segurança financeira aparece no topo desta lista. Desculpem a sinceridade - é que depois dos trinta eu deixei de ser hipócrita.

Voltando ao filme: o que eu vi foi justamente isso: um cara que exalava poder e conquistou a mulher, E me atirem pedras as mulheres que nunca suspiraram por um homem de terno; nunca tremeram nas bases quando um homem mais viril as fitou, avidamente; quando um homem realmente poderoso teve a audácia de corteja-la e a fez sentir a mulher mais foda de todas. Por favor, né?! Sem hipocrisia. No mais recôndito das fantasias, homens e mulheres sonham com parceiros poderosos, viris, sensuais, audaciosos e que os coloquem em pedestais. Afinal, isso é fantasia, gente! #pelamordedeus!

O bom da fantasia, no entanto, é o fato de ela jogar uma fagulhazinha na realidade e depois esvair-se no ar, deixando na boca o gosto doce dos beijos do seu parceiro. É o fato de ela deixar a vida mais divertida, porque a rotina cansa e mata qualquer relacionamento. A fantasia joga a medida certa de pimenta no dia a dia de duas criaturas que se complementam. E, eu digo a vocês: sou totalmente a favor das fantasias vividas a dois, com liberdade sexual entre marido e mulher e autonomia para mostrar ao outro o que é bom de verdade. E essa coisa de ser livre no sexo ganha espeço quando não sobram argumentos pudicos entre quem se ama e se quer.

Como diz Rita Lee: Sexo é imaginação, fantasia....... é poesia!




quinta-feira, 7 de maio de 2015

Amor de mais; Amo demais.

Eu costumo dizer que em soma de 2 + 2 não tem jeito de dar outro resultado, a não ser o próprio quatro. Isso é óbvio. Acontece (e isso a gente só descobre lá pelos 30, idade em que me encontro agora), que relacionamentos não são resultados oriundos de fórmulas perfeitas. Na verdade, eu desconfio que relacionamentos verdadeiros são o que resta quando todo o resto é massacrado pela sacrificante rotina do dia a dia e pelas tormentas da existência.

Essa minha crença de enxergar padrões em tudo já me fez passar por maus bocados. Eu acreditava, como menina, em príncipes encantados e finais felizes, como nos contos de fada. Pudera. Fui a filha única de um casal que sonhava - e ainda sonha -, com um mundo feliz e perfeito. Sua vontade paternal era a de me proteger de tudo - inclusive da vida. E, assim cresci sonhadora e destemida, protegida pelos heróis fictícios da minha infância. Amadureci acreditando que a felicidade era um comercial de margarida.

Mas a vida - ahhhh a vida -, a vida se impõe e desabrocha num sei lá o quê estonteante e desbaratador que nos joga no meio de uma tempestade que parece não ter fim. E, assim, eu fui jogada no mar da vida, tendo que lutar contra os monstros para os quais nunca havia sido apresentada. Conheci gente cruel. Gente que fazia sua felicidade roubando a alegria de viver dos outros; gente mesquinha, que se sentia dono dos outros e que, por isso, tinha o direito de desenhar futuros que nunca estiveram nos planos da sua vítima. Eu passei por muitos desses - até compreender que a vida é uma equação complicada e não uma conta de somar.

Quando me apoderei dessa compreensão, pude entender também qual era o tipo de relacionamento certo para mim. E pude encontrar a paz que eu sempre busquei. Nesse momento de profundas descobertas e revelações, eu entendi que príncipes encantados são chatos demais e que ser princesa é um saco. Príncipes e princesas não erram, são perfeitos; projeções imbecilizadas de uma perfeição que nós, seres humanos, nunca seremos capazes de alcançar. E eis aqui a nossa verdadeira beleza; o delta da nossa equação.

Essa capacidade infinita de formular futuros paralelos e, de repente, modificá-los por completo novamente, é a grande sacada de Deus para os seres humanos. Nossa grandeza, nossa beleza e toda essa inteireza de ser residem justamente no fato de sermos complicados, complexos e voluntariosos. Ao mesmo tempo que somos iguais, somos, também, completamente diferentes. Em nossas vicissitudes, nos travestimos dos sonhos brandamente guardados em nossas mentes e corações.

Por isso que, sendo tão complexos, relacionamentos não poderiam ser como contas de padaria. Eles são, sim, um emaranhado perigoso e louco das coisas mais deliciosas do mundo. Residem na construção de um lar e de uma família; moram na poupança acumulada para as viagens de fim de ano; dançam na lavagem de louças compartilhadas e na arrumação da casa - dia após dia. Fortalecem-se no toque sorrateiro do corpo durante a noite - mesmo após tantas noites juntos - e no sôfrego desejo de estar no outro, de ser o outro, mesmo já tendo-o desnudado tantas e tantas vezes. E perduram simplesmente pela resistência da vontade de duas partes serem uma.

Após os 30, eu redefini meu conceito de relacionamento. A experiência me fez compreender que a vida não é uma via em linha reta, mas um caminho sinuoso de curvas deliciosas e divertidas, as quais guardam descobertas e mistérios a cada novo dia. E aprendi que um único relacionamento pode ser muitos; pode ser mil relacionamentos em um só. E que o doce e o fel são necessários para deixar ainda mais gostoso o amor.