quarta-feira, 12 de outubro de 2016

O meu problema é que eu não consigo ficar calada. Isso é ponto pacífico. Sou boquirrota. Muita gente já me alertou acerta do fato de eu ser um verdadeiro pé no saco para quem não está nem aí. Outras gentes já me pediram para parar de reclamar e viver a vida. Mas, eu não consigo. Cresci sob a égide da contestação, criada por pais fãs de Chico e Elis e, iguais a mim, ávidos por um país melhor para todos nós. 

Hoje, entretanto, eu estou em choque. Esse sonho tão lindo, de construir uma sociedade multipla, está prestes a ser cancelado por vinte anos. Vinte anos nos quais os pobres serão mais pobres, a classe média vai ser apenas isso - mediana - e os mais ricos rirão da nossa desgraça. É a PEC 241 anunciando que os anos de chumbo estão prestes a regressar. Disfarçados. Bonitinhos. Quase democráticos. Mas vão voltar. 

Em linhas gerais, a tal PEC (Projeto de Emenda à Constituição) estabelece um limite de gastos para os próximos 20 anos. A partir de 2017, o orçamento do ano seguinte deverá ser estritamente igual ao do anterior. Caso o Estado não consiga cumprir com tais metas, as punições são, entre outras coisas, vedação à contratação de novos agentes públicos e à realização de novos concursos. Isso vale para os três poderes - Executivo, Legislativo e Judiciário. Salário mínimo será congelado. Educação e Saúde terão seus investimentos cortados na carne. Foda-se o mínimo necessário. Foda-se o objetivo de construir uma sociedade livre, justa e solidária. Foda-se o Brasil. 

O pior é que, como a Globo (obviamente) não está divulgando, as pessoas nem ao menos sabem o que está acontecendo. Eu mesma já indaguei algumas pessoas sobre o conhecimento da PEC e elas simplesmente dizem que não estão sabendo. As perguntas comuns são "do que se trada?!" e a resposta mais vil é "poxa, que horror!". Mas nenhuma reação no sentido de se indignar verdadeiramente. É triste, deprimente e assustador. 

Enquanto isso, o Brasil, quebrado pelos esquerdopatas (foi o que os coxinhas disseram), empresta dinheiro ao FMI. E até p FHC se mobiliza para ir à imprensa afirmar que esta direitização radical pode ser a ruína do Brasil (credo). São tempos difíceis e eu não acredito em mais nada. 

Gostaria de bradar a vocês que eu acredito em uma reação consistente; que o povo, desacordado, irá despertar para essa coisificação de nossa essência, mas a verdade é que eu vejo um futuro sombrio. E vejo mais: o triunfar de um projeto desenhado lá atrás, ainda na promulgação da CF/88, quando o legislativo se deu poderes intermináveis. Parabéns aos arquitetos dessa nojeira toda. 

Eu não vou dizer que não sonho mais. É difícil pra mim não sonhar. Sou uma romântica incorrigível. Quero acreditar nas pessoas, na vida, num futuro lindo, colorido e plural. Quero crer que meu filho, que não é rico, terá, no futuro, a oportunidade de viver num país plural, com chances iguais para todos. Mas isso, num fundo, é puro romantismo. 

Meus heróis morreram de overdose.