quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Metamorfose

Você não me conhece. Acredite. Aliás, são poucos os que têm esse privilégio. A grande maioria aposta mesmo que eu sou essa superficialidade permeada de sorrisos, leseiras (como a gente fala no nordeste), repleto de um cotidiano muito distante da sua superlatividade. Mas você não faz mesmo ideia de quem eu sou.

Os 30% os quais eu te deixo enxergar, me permitem manipular a visão que você acredita ter sobre mim. E - creia -, eu não sei se eu tenho interesse que você conheça meus outros 70%. Posso ser múltipla; um milhão de escorpianas, todas tão profundas quanto se pode ser. Posso ser a singularidade que te falta ou imensidão da qual você precisa. Tudo é questão de permissão e de permissividade.

Você não é capaz de me desvendar, eu afirmo. Sou um complexo emaranhado demais para mentes as quais se consideram superiores, mas que na verdade são apenas o reflexo fosco e confuso da arrogância. Prefiro manter-me em guarda, à espreita - pronta para a caça.

Nem tudo que se vê é o que parece, eu afirmo. Eu gostaria de poder te contar que sou fã do Chico (o Buarque - e um pouco do Science também); amaria discutir com você a profundidade de Saramago e de João Affonso de Sant'Anna; falar sobre a democracia o sobre o porquê de ela não se encaixar no atual contexto Brasil. Mas, do que adiantaria? Você continuaria a me enxergar como a revista de fofocas a qual você despreza. Melhor deixar assim.

No romance "Metamorfose", do escritor alemão Franz Kafka, um homem transforma-se em um inseto horroroso após abandonar todas os seus planos e expectativas para prover o sustento da família. Apesar do propósito glorioso de abdicar de si em prol do outro, o homem é rejeitado pelo núcleo e recebe em troca apenas ódio e desprezo.

Uma maçã arremessada contra ele e que dolorosamente se aloja em suas costas representa o ódio dos que deveriam ama-lo, terminando por matá-lo no fim da estória. Por isso, eu não me preocupo em lutar para que você me conheça. Escolho não tornar-me um  monstro em troca de alguma atenção ou mérito seu. Escolho ser eu - múltipla, viva, profunda e feliz -, ao invés de morrer aos poucos na ilusão de ser o que você ou qualquer outra pessoa acreditaria ser o melhor para mim.

Não me leve a mal, ok? Me leve à Paris!

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

Poesia para um estranho desassocego

Tortuoso caminho esse nosso
Sem rumo, sem paradas, sem destinos 
Cada curva da estrada é uma nova aventura
Cada olhadela de lado uma nova provocação
Sinto, de repente, o corpo sôfrego tremer, bandido
A boca seca ceder aos teus gemidos 
E o corpo em chamas queimar com o simples toque da sua pele 
Somos pele com pele 
bocas misturadas com nossas línguas
Meu sabor saboreando o teu
E esse gosto de quero mais que não quer me abandonar 
Te como com os olhos e com o paladar
Te sorvo por inteiro, cada gota, cada cheiro 
E aproveito cada momento - como se não houvesse qualquer depois. 


(Mariana Lira)

quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

Foda é ser mulher



Foda é ser mulher num mundo machista. Mulher mesmo, com m maiúsculo e muita atitude. Homens podem cortejar vinte mulheres ao mesmo tempo, serem galantes, sedutores, sagazes, exímios caçadores. A nós, mulheres, resta o papel da Santa submissa, que não sente desejo, não pode dizer o que quer, nem o que tem vontade, não pode ser a caça. Nunca pode ser a caça, de forma alguma.

Foda é não aceitar ser desse jeito e, mesmo assim, ser vista como lasciva, deslocada, uma mulher pouco aconselhável para se ter por perto. Para os idiotas machistas de Platão, aí vão algumas constatações:

1) mulheres adoram estar por cima - em todos os sentidos!
2) queremos ter a chance de conquistá-los, dê seduzi-los e de sorvê-los - até a última gota.
3) mulheres não suportam bancar a boazinha. A gente quer mesmo é colocar um salto agulha e ser notada - desejada, cobiçada e, se possível, despida.
4) mulheres têm uma queda vertiginosa por inteligência. É afrodisíaco, sabem? Por isso, podem parar de ser ou ao menos de fingirem ser uns imbecis
5) mulheres amam a conquista - principalmente se a presa em questão é um homem que reúne duas características matadoras: charme e inteligência. É de tremer as pernas.

É fato: as melhores mulheres são as que se arriscam; as que olham seus homens com olhos de cobiça; as melhores mulheres são aquelas que vão à caça, pois faz parte de suas naturezas animalescas; as melhores mulheres querem mandar e, na hora h, deixar seus parceiros com a doce ilusão de que quem manda são eles. As melhores mulheres são todas essas que se escondem atrás desses preconceitos machistas, retrógrados e perversos.

Mulheres de verdade vão à luta. Pois a luta faz parte do mais profundo de suas essências.

sábado, 23 de setembro de 2017

O futuro repete o passado

São 14:40h da tarde de um sábado qualquer. Ao longe, enquanto assisto a um filme sem importância, ouço meu pai transitando descompromissadamente por vídeos diversos no Facebook ou YouTube. De repente ele para e se detém numa imagem antiga. Elis canta "Como nossos pais". Ela relata a frustração de uma geração que foi às ruas lutar por democracia e liberdade e que, na canção, lamenta o presente negro de um país sem memória. Seria cômico se não fosse trágico. Mesmo tendo cantado a canção tantas vezes no passado, ela nunca fez tanto sentido quanto agora. Sinto a dor do meu pai, seu desespero silencioso frente às perdas gigantescas que temos tido nos últimos tempo. Estremeço. Teremos muitas mais ainda, principalmente porque o povo ou Vancansou de lutar ou nunca se propôs verdadeiramente a enfrentar o monstro que se esconde na noite escura da ignorância. Ouço o silêncio do meu pai - ele é ensurdecedor. Ele me atinge como mil adagas afiadas, repleto de perguntas que não podem mais ser respondidas. A frustração dele é o meu desespero. O que será de nós? O que será desse país que cambaleia, bêbado, na corda bamba de uma política fajuta e malsã? O que será de nós? Perdido em seus pensamentos, meu pai me fita distraído, quase que como se dissesse "Marvin, agora é com você". Agora é comigo, com você, com essa juventude que se esconde na falácia de um país ordeiro, alegre e justo. "O seu futuro eu sei de cor", ele finaliza entristecido. "Eu fiz o meu melhor"

Mariana Lira

quarta-feira, 21 de junho de 2017

Deus não joga cartas




Hoje foi a primeira vez, em muito tempo, que eu me olhei no espelho e vi o reflexo de uma mulher de 35 anos. Observei atentamente cada pequena ruga e marca de expressão; as manchinhas deixadas pela gravidez; a flacidêz que já começa a dar sinal; um fio de cabelo branco sobre a tez opaca. Confesso ter vislumbrado um tico de tristeza nestes olhos, os quais já viram tanta coisa e cegaram-se para tantas outras. Pudera. Ainda ontem eu havia enxergado a menina de 20 anos que um dia eu fui. Hoje, parece ter partido para ver outras paisagens. Ou simplesmente seguiu seu caminho, permitindo que agora eu siga o meu.

O ontem foi um dia difícil. O dia D. O dia que eu esperava que nunca acontecesse. De uma hora para outra, vi meus castelos de areia ruírem, tal e qual eu temia a tantos anos. Evitei muito. Acreditei em histórias as quais somente aconteciam na minha cabeça. Acho que foi um processo necessário frente aos muitos percalços os quais já enfrentei. Sem querer, aquelas estórias me ajudaram a manter a sanidade em tempos os quais, eu tenho certeza, qualquer outro piraria. Eu pirei. Mas só por alguns momentos.

Eu até quis chorar. Juro. Queria sentir a magnitude de ser abandonada por aquelas narrativas fantásticas. Acho mesmo que tinha a obrigação de sentir em demasia aquela nova despedida. Mais uma. Uma lágrima caiu, solitária e crua. E dissipou-se, nua, nos poros muito abertos da minha pele já muito gasta. Aquela lágrima, tão pura e casta, foi tudo que eu consegui verter naquela partida. Era eu que partia, estranha e incrédula, para a vida que eu neguei a vinte anos atrás.

Eu juro que eu queria sentir mais. Arraigar dentro de mim tudo isso que ficou estático, paralisado, suspenso. Foram vinte anos de um turbilhão silencioso, corroendo minha paz, meu sono e meus caminhos. Foram muitos porquês não respondidos; muita culpa represada; muita felicidade perdida. E no fim... Nada. Não tinha nada. Mais nada. Para não ser injusta, havia (há) um carinho, um cuidado, um resquício de amor estranho, o qual somente quer a felicidade e o bem estar do outro. Talvez eu tenha amado de verdade. Essa é a verdade nua e crua.

De repente, eu percebi que Deus não joga cartas. Que as coisas se deram como deveriam, na medida das possibilidades dessa vida louca a qual nos joga de um lado para o outro, como se fôssemos bonecos de pimbolim. Deus não está para brincadeira. Não existe acaso, sorte ou azar. Apenas existem caminhos os quais precisam ser percorridos, lições que precisam ser aprendidas e ensinadas. Realidades as quais precisam nos absorver, por completo, para que saiamos, então, mais fortes, mais crentes e renovados.


E, embora eu ainda não me saiba feliz ou triste, creio mesmo ter sido uma dádiva (re)viver tudo isso. Ter a chance de fazer o que lá atrás não foi possível. E criar novos laços – muito mais fortes – os quais de fato nunca serão rompidos. A mágica de tudo isso é não dramatizar; poder estufar o peito e afirmar que valeu a pena; que eu saio mais forte do que fraca; e que de fato a vida me deu mais um presente: a oportunidade de seguir em frente, pois já não há mais correntes que possam me frear. Paz?! Não sei ainda. Mas estou tranquila, lépida e de alma lavada. Estou límpida.

sexta-feira, 16 de junho de 2017

É a porra do Brasil

"Que país é este?!" Perguntou-nos, um dia, o grande filósofo da modernidade, Renato Russo. Da platéia, uma multidão de jovens esquecidos pelas entidades políticas e públicas, e com suas esperanças de futuro destroçadas por fatores como o aumento do desemprego e da violência, respondia, numa revolta inconsciente e explosiva: "é a Porra do Brasil!!".

E hoje eu me pergunto qual a nossa real parcela de culpa para toda esta desesperança e esta revolta? Que país é este? Lá fora, nos países ditos de primeiro mundo, por preconceito ou por verdade, as informações que circulam ao nosso respeito são deploráveis. Somos mal-educados, doidivanas e permissivos. Até poucos anos atrás, o que se divulgava do país eram imagens de prostituição e violência. Em tempos de crise ambiental, circulam, na Europa, adesivos que dizem "Salvem a Amazônia. Matem um brasileiro".

Que país é este? Até quando colocaremos esta culpa malfadada nas mãos de nossos líderes? Até quando nos esquivaremos da real responsabilidade que temos com relação ao crescimento e desenvolvimento do nosso país? Enquanto ficarmos criticando nossos gestores por demitirem ladrões de dinheiro público e não nos conscientizarmos do nosso próprio comodismo e absoluta ignorância, seguiremos como patos amarelos e inflados em meio à turba.

O país está a beira do caos. Todas as instituições estão desacreditadas. E nós, nos achando espertos, seguimos fazendo paródias e piadas infames com os 3 poderes, que deveriam ser o cerne da nossa existência enquanto nação. O judiciário vendeu a definitividade de suas decisões; o legislativo legisla em proveito próprio, integrado por patifes eleitos pelo povo e que usam tal prerrogativa para atender às próprias demandas. O executivo, meu Deus, este está fodido mesmo.

Depomos uma presidenta legalmente eleita, honesta, que não cometeu crime de qualquer ordem. Foi, inclusive, inocentada pelo TSE em decisão histórica no sistema judiciário tupiniquim. Entretanto, como este mesmo sistema não tem o poder de reformar decisões políticas, seguiremos com um autêntico criminoso a comandar a orquestra desafinada destes dias hostis.

Que país este?!? Este é o país o qual esqueceu-se dos anos de chumbo e que foi às ruas pedir a volta da ditadura; é o país que viu um deputado fazer apologia ao comandante Ustra, no plenário da casa do povo. É o país que assiste atônito e inerte ao desmonte dos direitos sociais, previdenciários e trabalhistas sem, no entanto, levantar uma panela sequer. É um país comandado pelas forças espúrias da mídia. Que triste nação é esta marcada pelo fantasma da inação e entregue à própria sorte, escolhida e cultivada  ao longo de tantos anos de uma indecente falta de postura.

"Salvem a Amazônia. Matem um brasileiro". Temo que, muito em breve, vejamos esta como a única solução.

Mariana Lira

quinta-feira, 8 de junho de 2017

A urgência do tempo não me permite parar agora



Eu queria ficar muda. Tirar uma folga desse turbilhão que mora em mim. Mas escritores padecem com os personagens que adornam de cor, de dor e de confusão suas vidas obscuras e eremitas. A ideia era ficar out. Tem muita coisa acontecendo. Muitas verdades se repetindo. Muito passado me engolindo pelo pé. Esse passado, que de fato nunca passou, hoje me assola com sua presença combustível e gigantesca. Tirou-me do prumo, tirou-me do eixo.

Entenda. Não é que o presente não me apeteça. A questão é que a gente vai fazendo escolhas durante a vida e, quando se apercebe, criou um monstro o qual nos devora todas as manhãs, quando olhamos no espelho. A crueza dessa verdade é que, se pudéssemos, voltaríamos no tempo – cada um de nós -, e daríamos uns bons cascudos naqueles jovens que fizeram tanta merda em seus anos de ouro. Era tão fácil escolher o certo!! Mas a gente tem medo, não tem grana e nem peito pra enfrentar as consequências. Somos inconsequentes. Abestalhados mesmo.

Agora estou eu, de frente para um espelho que somente reflete a menina de 20 anos atrás. É perturbador, sabe?! É como se, de repente, eu pudesse dizer a ela o que e como fazer, por onde ir e aonde chegar. É uma liberdade tão grande que chega a amedrontar isso de poder refazer caminhos e tomar novos rumos. A verdade é que eu quero me livrar dessa culpa que me pesa os ombros há tantos anos.

Decidi, então, que não vou mais ficar calada. Sou boquirrota mesmo, pra quê mentir não é mesmo?! Não quero mais fugir, escapar, desviar o olhar e nem desabar frente as novas realidades as quais surgirão depois tanto furor. É preciso ser fortaleza, onda que bate na pedra, e de tanto bater, fura. Não vale a pena falsear esse tudo que existe dentro de mim. Não depois de tantos percalços.

O engraçado é que, de uma hora para outra, virei uma leoa. Creio que seja medo de perder um tempo maior ainda. Medo de encarar uma vida sem porquês, sem efeito, mas cheia de defeitos. Ando querendo sentir tudo na pele, na carne. Ando à flor da pele, como me lembra sempre o Zeca. Não quero digerir mais nada; a ideia é vomitar esse escárnio que me envenena a alma, envelhece as faces e bloqueia meus passos – os quais agora só querem correr.


Então, me desculpem se eu for grossa ou de repente parecer uma louca. A urgência do tempo não me permite parar agora. Agora eu só vou embora quando tudo terminar, quando esgotar-se completamente essa fonte de não sei o quê dentro de mim. Tal e qual um câncer, é preciso expurga-lo, purificar-me a alma e a existência. E dançar nesse ritmo até a música, enfim, acabar. Afinal, eu agora sei, nada nunca impede a vida de acontecer. 



terça-feira, 9 de maio de 2017

Meninas são estúpidas, vá por mim. E se são ansiosas aí é que fodeu tudo mesmo

Às vezes (ou quase sempre) você só quer uma segunda chance. Precisa dela para acalmar os próprios demônios internos, os quais nos azucrinam ao longo da vida. Isso tudo porque a gente não nasce com um manual, cheio de explicações sobre o que e como fazer durante a existência e segue cometendo erros - por vezes bobos; noutras, grotescos. Não desejo para ninguém o amargor do "e se..."; o peso das dúvidas que nos tiraram dos trilhos; a responsabilidade de arcar com o fracasso, fruto de escolhas que, no fim, são somente nossas. Não desejo mesmo.

Eu precisava de uma segunda chance. Precisava de um botão que me voltasse no tempo e me desse outras memórias, só pra ser mais feliz. Precisava acordar vinte anos atrás com a cabeça de agora e tomar as rédeas como uma mulher, não como uma menina. Meninas são estúpidas, vá por mim. E se são ansiosas aí é que fodeu tudo mesmo. Hoje, minha ansiedade não cabe em mim. Hoje eu percebi que não tenho mais tempo; que a vida não rebobina; que não dá pra mudar palavras que foram ditas, assuntos que foram cortados no meio do caminho; não dá pra desistir de desistir. Não dá. Não dá mais. A vida andou pra frente e só agora eu vi que eu fiquei lá atras, naquele instante que nunca se resolveu dentro de mim. 

Será que é pedir demais consertar os erros? É atropelo querer mais tempo, quando a vida corre, tal qual um trem bala? Será egoísmo querer assim?! Ou será somente um desejo enorme de ter a felicidade que eu sempre busquei - e a qual eu estou certa de ter plenos direitos? Será que eu tenho direito?! A porra do "e se..." fodeu comigo. Não desejo esse buraco no espaço-tempo nem pro Temer, pra vocês terem uma ideia. 

Pois bem. Eu pensei que teria uma nova chance. Que o sol brilharia novamente pra mim. Que eu estaria ali defronte com a menina que eu perdi a tantos anos atrás pelo simples medo de enfrentar o mundo. Naquele "e se..." eu me perdi completamente - e temo nunca mais me encontrar.

Por isso, na próxima vez que pensar em desistir, lembre-se da escritora que perdeu a chance por ser covarde demais; por achar que haveria outras oportunidades; por acreditar na balela que a felicidade bate na porta da gente sempre que a gente permitir. Uma vez que se fecha a porta para a felicidade, ela não volta. Jamais. Percebi que ela é vingativa, encrenqueira e muito, MUITO orgulhosa. Não olha pra trás, não dá novas chances. Simplesmente te olha de relance e diz, irônica: pode comemorar! Você não me verá nunca mais. 

quinta-feira, 16 de março de 2017

O dia em que a terra parou



16 de Março de 2017. Ontem, dia 15, foi chamado pela imprensa como "o dia em que a terra parou", em alusão às paralisações que tomaram as ruas, órgãos e empresas públicas espalhadas pelo país. Todas essas pessoas - jovens, velhos, adultos, crianças, funcionários públicos ou privados -, protestavam juntos contra a aprovação da Reforma à Previdência. 

Como petista - esquerdopata, mortadela ou reacionária, como alguns gostam de me chamar -, eu achei lindo. Foi lindo ver as ruas pintadas de vermelho, gritando em uníssono que não - não!! -, não deixaremos que roubem nosso futuro para alimentar bolso de político fanfarrão. Entretanto, como jornalista, realista ou, como já me disseram esses dias, pessimista (foram os anos, eu reafirmo), eu não consigo enxergar legitimidade no movimento. Mais uma vez, as pessoas se uniram em prol de causas individuais e não pelo coletivo da nação. Doeu em seus bolsos e doerá nos bolsos dos seus filhos e netos. 

Os coxinhas agora dizem que somos todos um único povo, que é preciso aglutinar-se em torno de uma pauta única e lutar contra os grilhões de uma política autoritária. Eu, do meu lado, só consigo pensar que é aviltante ouvir esse tipo de declaração de quem, há um ano atrás, foi às ruas depor uma presidenta honesta, democraticamente eleita. Gente que bradou aos quatro ventos querer de volta a ditadura. Gente que bateu em mulher com filho de colo somente por estar usando vermelho em local e hora "errados" (será?!). 

Eu não acho que somos todos um único povo. Somos uma nação flagelada pela ignorância fomentada desde os dias de chumbo, pela luta diária e desarrazoada pelo pão do dia a dia e por não poder dar-se ao privilégio de instruir-se por prazer. Vivemos sob a alcunha de conglomerados midiáticos, profundamente influenciados e influenciadores da política malsã que tanto desacredita o nosso país. E a coisa só vai piorar (sorry!). Com a reforma educacional prevendo extirpar das salas de aula matérias-base como história e geografia, é provável que o nosso país caia ainda mais no abismo da estupidez contra a qual pessoas como meus pais, o Lula, a Marisa e até o próprio FHC (há controvérsias) lutaram quando da abertura política. 

Isso tudo foi para falar do depoimento do Lula, que foi lindo. Lindo como a ideologia que este grande estadista professa. Foi lindo ver seus olhos cheios de verdades, seus argumentos robustos dando nocaltes homéricos em perguntas formuladas para derrubá-lo. Foi lindo ver como suas crenças estão de tal forma enraizadas que não há maneira de dissociar um do outro. O Lula é e sempre será o mensageiro da boa-nova. Eu tenho cá minhas dúvidas se ele voltará a se candidatar em 2018. Como ele mesmo disse, são 71 anos de estrada e ele mal sabe o quanto de vida lhe resta. Ainda mais agora, depois de perder a companheira de lutas, de amor e de história. Acho egoísmo pedir isso de um cara tão gente boa como o Lula. Que ele lute por sua honra, pelo respeito às suas memórias e pelo não desmantelamento de sua história. Tê-lo como Presidente será apenas mais um lucro nessa fantástica aventura que é viver neste país. 

Lula Lá! - Sempre!

(Mariana Lira)